DANÚBIO REMY
O direito ao governante honesto é exaltado como direito fundamental de quarta geração pelo prof. Djalma Pinto, em sua obra Direito Eleitoral – Improbidade Administrativa e Responsabilidade Fiscal. Segundo o professor, governante honesto “é que pauta suas ações nos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.”
Cabe, portanto, ao Direito Eleitoral aprimorar os mecanismos que garantam a moralidade administrativa e a probidade para o exercício de mandato eletivo, em respeito ao § 9º do art. 14 da Constituição do Brasil de 1988.
De acordo com a Lei Federal nº 9.504/1997, a prestação de contas de campanha é exigida de todos os candidatos e partidos políticos que participaram do pleito eleitoral, mesmo que tenham renunciado ao longo do período. Ela deve ser apresentada até 30 dias após a realização das eleições.
O objetivo principal da prestação de contas é atestar a regularidade na arrecadação e aplicação dos recursos de campanha feitas ao longo do período eleitoral, com a finalidade de preservar a transparência das transações financeiras dos candidatos e, impedir que partidos e candidatos se utilizem de fontes de recursos não contabilizados, ação ilícita que ficou conhecida como “Caixa 2”.
No tocante à análise das prestações de contas, a Justiça Eleitoral é responsável por decidir se ela será aprovada, aprovada com ressalvas, desaprovada ou pela não prestação.
Em relação à aprovação das contas, (com ou sem ressalvas) não poderá haver repercussão negativa na esfera do candidato. Já em relação à não prestação de contas, ao candidato que não as apresentar será negada a certidão de quitação eleitoral (comprovante de que está regular perante a Justiça Eleitoral) pelo prazo igual ao do mandato pelo qual concorreu e, ultrapassado esse prazo, até que as contas sejam apresentadas. Em relação a isso, a questão segue pacífica nos tribunais.
A grande discussão, no entanto, gira em torno da rejeição das contas apresentadas pelos candidatos e da concessão ou não de quitação eleitoral em decorrência disso. Esse tema foi item de frequente discussão pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que vem alterando seu entendimento aos longos dos últimos anos.
Em 2008, o TSE, por meio do art. 41, § 3º3, da Resolução nº 22.715/2008 tinha o entendimento de que a desaprovação das contas de campanha impedia a obtenção da certidão de quitação eleitoral do candidato, que, entre outras finalidades, é necessária para o registro de candidatura.
Em 2009, a Lei Federal nº 12.034/2009 incluiu o § 7º ao art. 11 da Lei das Eleições (Lei Federal nº 9.504/1997), cuja redação é que “ a certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009.) “
Em virtude desse novo dispositivo legal, o TSE passou a divergir quanto a esse tema.
Havia um posicionamento no sentido de que a desaprovação das contas continuaria a impedir a obtenção de certidão de quitação eleitoral ao respectivo candidato sob o argumento de que a referida norma deveria ser interpretada à luz dos princípios norteadores do processo eleitoral, em defesa do ideal do governante honesto, que deve ser buscado ainda na fase de seleção democrática.
Porém, o legislador ponderou pela relativização da aprovação da prestação de contas como elemento de eficácia do governante honesto. Seguindo parcela de entendimento dos ministros do TSE, o legislador entendeu que o adjetivo “regular” não significava a necessidade de aprovação das contas de campanha, de modo que a desaprovação das contas não impediria a quitação eleitoral do candidato (REspe nº 4423-63/RS, rel. Min. Arnaldo Versiani, em 28.9.2010).
Portanto – as ações de legalidade e eficiência do candidato na prestação de contas deixou de ser elemento do direito fundamental de quarta geração.
*Danúbio Cardoso Remy Romano Frauzino é advogado, mestre em Ciência do Direito pela Universidade de Lisboa, especialista em Direito Público pela UFG e especialista em Direito Eleitoral pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro.